quinta-feira, novembro 18, 2004

A questão do referendo

A necessidade de se realizar um referendo parece-me mais do que pertinente, é absolutamente necessária. A indispensabilidade do referendo não se prende – por agora – com o resultado que ele possa ditar.

Não se têm realizado todas as consultas populares que se impunham. Questões surgiram que confeririam maior credibilidade ao poder político se tivessem sido devidamente sancionadas pela opinião popular. Estou a pensar na questão de Maastricht, por exemplo.

Os referendos que se efectuaram não me pareceram muito leais, nomeadamente na questão do aborto. O texto encontrado para a pergunta não foi inequívoco, nem tão pouco consensual. A questão da regionalização teve mais a ver com uma escaramuça de extremas. Onde começa uma região, onde termina a outra. Os benefícios operacionais não chegaram a ser devidamente debatidos. Mas isto já são notícias antigas.

Agora temos a rectificação da Constituição Europeia para decidir. Seria muito grave a decisão ser tomada unicamente pelo poder político, em especial com a sua actual temperatura. Depois de já termos de nos resignar com um Primeiro-ministro que não se submeteu a um escrutínio, grave seria continuarmos a ser ignorados. Acredito no entanto que a tentação é grande, o encantamento de governar por sondagens é enorme. A esmagadora maioria dos países da EU irá realizar uma consulta popular, seria muito mau que o país do “quase” Presidente da Comissão Europeia ficasse de fora. Seria mais uma vez uma má fotografia, depois da que foi tirada na base das Lages nos Açores.

A questão a colocar aos portugueses (e portuguesas, claro) acaba de ser anunciada. Os partidos do Governo e o maior partido da oposição acordaram o texto. "Concorda com a Carta de Direitos Fundamentais, a regra das votações por maioria qualificada e o novo quadro institucional da União Europeia, nos termos constantes da Constituição para a Europa?". A decisão de se fazerem em simultâneo três perguntas, não me parece – mais uma vez – muito leal. A argumentação de defesa consiste na impossibilidade imposta pela Lei Fundamental em se referendar tratados assinado por Portugal.

O Presidente da República terá se anuir com esta proposta, certamente que a sua decisão será a cópia do parecer do Tribunal Constitucional. Não sendo jurista, não me pretendo imiscuir na questão legal que forçosamente terá de ser respeitada. Defendo a clareza, a discussão e o debate de ideias. O mais correcto será realizar mais uma alteração à Constituição. O tal impedimento deverá ser extraído. Depois de eliminado, a questão deverá ser colocada de uma forma clara e autêntica.

Já referi que o resultado por agora não é importante, pois penso que países como o Reino Unido, Suécia e a Alemanha vão demorar a aprovar a adesão global. Com o actual texto da Constituição Europeia, não parece provável que se verifique uma aprovação, pelo menos no Reino Unido. Este é um aspecto positivo, pois o Tratado, apesar de já assinado, pode ser melhorado. Os países citados têm a força necessária para que tal suceda.

Em Portugal é necessário que a questão seja abertamente discutida. Este poderá ser o momento para despoletar um envolvimento cívico. O alheamento que os portugueses manifestam em relação ao seu dever cívico tem de terminar. Não se podem realizar consultas populares em que o vencedor é sempre a abstenção. Vamos discutir a questão europeia como o pretexto de iniciar um debate imperioso sobre a realidade portuguesa, ao nível nacional e internacional.

Não basta falarmos mal de quem nos governa. Por enquanto – não se sabe por quanto tempo - ainda vivemos num regime democrático, em que o último decisor é quem vota, aquele que se manifesta. É verdade que tem vindo a ser arquitectado um ambiente mofo, promotor de uma auto-exclusão. Pouca coisa funciona neste país que promova um maior envolvimento. A verdade é crua – e muito dura – temos maus governantes, porque somos péssimos cidadãos, somos uma vergonha para todos aqueles que lutaram por uma sociedade democrática. Os políticos que nós temos, não são mais do que o reflexo da nossa própria identidade.

Os agentes do ensino, os grupos – genuinamente – cívicos, os jornalistas (não me refiro aos assessores de comunicação) e todos os outros que ainda estão no limbo da consciência, deverão finalmente envolver-se, ajudar a esclarecer as pessoas. Não é necessário que seja no mundo mediático da televisão, será suficiente se o seu envolvimento se concentrar no dia-a-dia. Provoquem as pessoas que vos rodeiam, obriguem – caso necessário, ensinem – as pessoas a pensar pela sua própria cabeça.

Quando isso acontecer, Paulo Portas terá de voltar à pena e Santana terá de procurar um escritório no Infantado para exercer advocacia… se ainda forem aptos. Porque como governantes já provaram que estão cobertos de uma grave inaptidão. Estou a utilizar estes dois senhores como exemplo, pois são muitos mais… nessa altura o Instituto do Emprego terá muitas novas inscrições.


Uuufff, já me sinto melhor...

Sem comentários: