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Escolha das Notícias Não Permite Neutralidade
Por CLARA RAIMUNDO - Jornal Publico - Domingo, 19 de Setembro de 2004
Não há neutralidade quando se trata de escolher que notícias têm espaço nos jornais portugueses. Esta foi uma das ideias lançadas durante o ciclo de debates e conferências organizado pela associação cultural Abril em Maio, que começou na sexta-feira à noite e termina esta tarde, subordinado ao tema "Como se escolhem as notícias".
A questão, que funciona como fio condutor de um conjunto de cinco mesas-redondas, foi levantada pelo subdirector do jornal PÚBLICO, Nuno Pacheco, num colóquio organizado pela mesma associação, enquanto se discutiam as diferenças entre a escolha das notícias nos jornais partidários e generalistas.
Mário Mesquita teve as honras de abertura do ciclo, com a apresentação do seu estudo acerca do tratamento da efeméride dos 30 anos do 25 de Abril no Jornal de Notícias. E ontem foi a vez de mais de uma dezena de convidados, na sua maioria jornalistas, se sentarem em volta da mesa-redonda da sede da Abril em Maio, e responderem à questão, que se subdividiu em três: como se escolhem as notícias na Política, na Cultura, e na Sociedade.
"Há três princípios básicos que deverão presidir à selecção de notícias: a actualidade, o impacte social, e o interesse público da matéria", defende o jornalista João Mesquita. O problema está no facto de não existir "neutralidade por parte de quem preside à aplicação destes critérios", explica.
Nuno Pacheco acrescenta a estes princípios o da novidade, mas assume que "os interesses pessoais dos jornalistas e a sua maneira de ver o mundo influenciam as suas propostas [de notícias]". Para ele, o jornalista funciona como a "principal peça da engrenagem" no processo de escolha das notícias, e deve, por isso, assumir uma "responsabilização absolutamente pessoal".
Esta ideia é partilhada pela directora do Curso de Jornalismo da Escola Superior de Comunicação Social, Estrela Serrano. "Se os jornalistas forem marionetes, o jornal morre." Segundo a professora e investigadora, as notícias resultam de interacções entre jornalistas, "parajornalistas" (outros profissionais dos media), fontes, hierarquia, proprietários e audiências. E é aos jornalistas que cabe o "papel-chave nesta interacção".
Estrela Serrano chama, aliás, a atenção para aquela que considera "uma alteração muito significativa" nos "media": o protagonismo dos jornalistas. "Os jornalistas são cada vez mais actores políticos. A voz dos jornalistas sobrepõe-se à dos políticos", afirma.
Paradoxalmente, segundo João Mesquita, "o poder dos jornalistas nas redacções é cada vez menor", estando a sua responsabilidade cada vez mais sujeita a um conjunto de pressões e influências. Um facto incontornável, de acordo com diversos estudos citados pelo jornalista, é o peso cada vez menor do noticiário sobre política no conjuntos dos órgãos de comunicação social. "O que temos nos jornais portugueses nas páginas de política são notícias sobre os actores políticos", sublinha Estrela Serrano.
Sobre o espaço dado às notícias de Cultura, Francisco Belard, jornalista do semanário "Expresso", diz que, "hoje, os jornais encaram isso quase como um favor". O (...) explica que "essa secção não preocupa por aí além os directores e a administração [dos jornais]". "Passamos o ano a queixar-nos de que não temos espaço", diz.
A queixa de João Paulo Cotrim, (...), é outra: "neste momento, os jornais são sobretudo opinião. E deixou de haver perspectiva. É tudo tratado da mesma maneira: a ópera e a Madonna".
Eduarda Dionísio, da direcção da Abril em Maio, aproveitou para deixar no ar mais duas questões: a que se deve o abandono da leitura de jornais por quem costumava lê-los, e como explicar que os jovens não os leiam.
domingo, setembro 19, 2004
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