Dez horas. Esta terça-feira não começou da melhor maneira.
Às oito horas sujei a camisa que tanto trabalho me deu a passar com sangue de lamina velha.
Mais uma eternidade a ferros, engomalutando com os vincos de chuva da madrugada.
Através do cinzento da manha, com camisa lavada e passada de raiva, consegui chegar à estação. Retirei os improvidados pensos de papel higiénico quando vi a vergonha da minha cara reflectida nos olhos esbugalhados do espanto dos outros passageiros.
O ser insensível que maquinava (se um condutor conduz, um maquinista…não é ?), como eu ia escrevendo, o tipo que maquinava, enraivecido de ter de transportar os sortudos energúmenos que se levantaram seis horas após ele ter começado a sua monotona labuta, colocou o ar condicionado num nível tão quente que até eu, nos meus parcos, e leves, décimos de tonelada, me sentia incomodado pelo fluido aquoso que insistia em passar através da camisa, provocando os inevitáveis estragos em todo aquele titanico esforço matinal.
Sentado na madorna embalada e com uma paisagem que se resumia ao reflexo no vapor da respiração de uma amalgama de seres, encostei-me, cerrei os olhos e dormitei.
De repente, conjuntamente com uma sensação de isolamento provocada por uma carruagem vazia, acordei e percebi tudo.
Já tinha passado a estação de Entrecampos.
Estação do Areeiro, dez e quarenta e cinco. Aguardo a chegada de um táxi.
Lembrete: Comprar laminas novas e, logo à noite, passar duas camisas.
F.Marinho
terça-feira, setembro 30, 2003
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