Vamos a isso que eu também tenho algumas para a troca.
Jokas e abraços, respectivamente.
F.Marinho
PS. Os nossos agradecimentos aos colegas da "Nova" (www.rotflol.blogspot.com) pela visita.
Um grande abraço para eles todos também.
segunda-feira, maio 24, 2004
Fotografias
Que tal organizar um almoço com a finalidade de finalmente todos trocarmos as fotos?
A ideia é simples cada um de nós levaria 2 ou 3 cds, ou um dvd-r (virgens...), da minha parte levaria o meu portátil, já com uma pasta criada com todas as fotografias que disponho e gravaria nos cds de todos os interessados.
Se os outros felizes detentores das muy ilustres fotos, também levassem as suas fotos. aí sim teriamos finalmente um album completo!
Estão de acordo?
Beijos e abraços,
Luís Zúquete
A ideia é simples cada um de nós levaria 2 ou 3 cds, ou um dvd-r (virgens...), da minha parte levaria o meu portátil, já com uma pasta criada com todas as fotografias que disponho e gravaria nos cds de todos os interessados.
Se os outros felizes detentores das muy ilustres fotos, também levassem as suas fotos. aí sim teriamos finalmente um album completo!
Estão de acordo?
Beijos e abraços,
Luís Zúquete
sexta-feira, maio 21, 2004
EURO-2004
Para quem gosta destas coisas!
http://www.vespaclubroma.it/lisbona.htm
Aquele abraço,
Luis Z.
http://www.vespaclubroma.it/lisbona.htm
Aquele abraço,
Luis Z.
quinta-feira, maio 20, 2004
Boas vindas à Olga
A Olga passou a fazer parte desta seita underground...
O pessoal podia começar a pensar em actualizar o seu perfil... para a coisa ficar mais composta... que tal?
Que acham aqui das novidades? Ficou bem o nosso blogue? Reconhecem os dois cromos lá bem em cima?
..:: carlos galveias ::..
PS: Depois da bênção das fitas impõe-se uma confraternização final... lá para meados de Junho... depois de todo o stress... mas antes das férias... que tal ler de vagar?
O pessoal podia começar a pensar em actualizar o seu perfil... para a coisa ficar mais composta... que tal?
Que acham aqui das novidades? Ficou bem o nosso blogue? Reconhecem os dois cromos lá bem em cima?
..:: carlos galveias ::..
PS: Depois da bênção das fitas impõe-se uma confraternização final... lá para meados de Junho... depois de todo o stress... mas antes das férias... que tal ler de vagar?
Mais umas almas roubadas... hokahey...
Aqui vão as primeiras... têm o patrocínio do Hugo
..::carlos galveias ::..
..::carlos galveias ::..
terça-feira, maio 18, 2004
A benção...
Com efeito foi um dia muito longo e produtivo!
Que melhor benção poderia haver que aquela? (nem sequer apanhei escaldão, nem fui apalpado, como alguns...)! Ganhei um baralho de cartas... participei numa animada tertúlia, fiz o jogo de snooker da minha vida, gastronomia internacional, assinei as minhas primeiras fitas da nossa turma e acima de tudo tive o prazer de estar acompanhado por mais que colegas de curso, amigos naquela que terá sido para mim a melhor tarde de aulas do nosso curso...
Gostei muito de estar com todos os presentes e claro também fizeram falta os ausentes!
E cheguei a uma conclusão: Preciso de aulas extra...!
Um abraço a todos!
PS- Tenho 147 Fotografias de sábado...! Negócios à vista????
Luís Z.
Que melhor benção poderia haver que aquela? (nem sequer apanhei escaldão, nem fui apalpado, como alguns...)! Ganhei um baralho de cartas... participei numa animada tertúlia, fiz o jogo de snooker da minha vida, gastronomia internacional, assinei as minhas primeiras fitas da nossa turma e acima de tudo tive o prazer de estar acompanhado por mais que colegas de curso, amigos naquela que terá sido para mim a melhor tarde de aulas do nosso curso...
Gostei muito de estar com todos os presentes e claro também fizeram falta os ausentes!
E cheguei a uma conclusão: Preciso de aulas extra...!
Um abraço a todos!
PS- Tenho 147 Fotografias de sábado...! Negócios à vista????
Luís Z.
(A)mizade em (A)ristóteles
Por falar em Aristóteles... gosto muito deste texto... fala de amizade... segundo Aristóteles... Encontra-se neste site.
A Amizade em Aristóteles
Aristóteles - filósofo grego. Nasceu em 10 de Janeiro de 0384 a. C., Estagira. Faleceu em 31 de Dezembro de 0322 a. C. Um dos mais importantes pensadores de todos os tempos. Texto extraído da obra "Ética a Nicômaco", O Livro das Virtudes - William J. Bennett. 1995 Cia. das Letras, São Paulo.
Assim como os motivos da Amizade diferem em espécie, também diferem as respectivas formas de afeição e de amizade. Existem três espécies de Amizade, e igual número de motivação do afecto, pois na esfera de cada espécie deve haver "afeição mútua mutuamente reconhecida".
Aqueles que têm Amizade desejam o bem do amigo de acordo com o motivo da sua amizade; desse modo, aqueles cujo motivo é a utilidade não têm Amizade realmente um pelo outro, mas apenas na medida em que recebem um bem do outro.
Aqueles cujo motivo é o prazer estão em caso semelhante: isto é, têm Amizade por pessoas de fácil graciosidade, não em virtude de seu carácter, mas porque elas lhes são agradáveis. Assim, aqueles cujo motivo da Amizade é a utilidade amam seus amigos pelo que é bom para si mesmo; aqueles cujo motivo é o prazer o fazem pelo que é prazeroso a si mesmo; ou seja, não em função daquilo que a pessoa estimada é, mas na medida em que ela é útil ou agradável. Essas Amizades são portanto circunstanciais: pois que o objecto não é amado por ser a pessoa que é, mas pelo que fornece de vantagem ou prazer, conforme o caso.
Tais Amizades são de facto muito passíveis de dissolução se as partes não permanecem iguais: isto é, os outros cessam de ter Amizade por eles quando deixam de ser agradáveis ou úteis. Ora, a natureza da utilidade não é de permanência, mas de constante variação: assim, quando o motivo que os tornou amigos desaparece, a Amizade também se dissolve; pois que existia apenas em relação àquelas circunstâncias...
A perfeita Amizade é a que subsiste entre aqueles que são bons e cuja similaridade consiste na bondade; pois esses desejam o bem do outro de maneira semelhante: na medida em que são bons (e são bons em si mesmo); e são especialmente amigos aqueles que desejam o bem a seus amigos por si mesmo, porque assim se sentem em relação a eles, e não por uma mera questão de circunstâncias; assim, a Amizade entre esses homens permanece enquanto eles são bons; e a bondade traz em si um princípio de permanência...
São poucas as probabilidades de Amizade dessa espécie, porque os homens dessa espécie são raros. Além disso, pressupõem-se todas as qualificações exigidas, essas Amizades exigem ainda tempo e intimidade; pois, como diz o provérbio, os homens não podem se conhecer "até que tenham comido juntos a quantidade de sal necessária"; nem podem de fato admitir um ao outro em sua intimidade, muito menos serem amigos, até que cada um se mostre ao outro e dê provas de ser objecto apropriado para a Amizade.
Aqueles que iniciam apressadamente uma troca de gestos amigáveis querem ser amigos mas não o são, a menos que sejam também objectos apropriados para a Amizade e se reconheçam mutuamente como tal: ou seja, o desejo de Amizade pode surgir rapidamente, mas não a amizade propriamente dita.
Chegaram até aqui... eu e os textos longos. Mas o tempo é algo de muito insignificante quando se fala de amigos, de amizade.
O desafio agora é outro - citando outro "velho amigo", Elmer Letterman - "Só existe uma coisa melhor do que fazer novos amigos: conservar os velhos"...
Da minha parte tenho a dizer que tem sido um prazer. Quanto a sentimentos, tive a sorte de alguém me ter escrito na minha fita: "As amizades não se escrevem... sentem-se!"
Que mais posso dizer?
Abraços & Beijos na testa...
..::carlos galveias::..
"Quem não vê bem uma palavra não pode ver bem uma alma"
Fernando Pessoa
A Amizade em Aristóteles
Aristóteles - filósofo grego. Nasceu em 10 de Janeiro de 0384 a. C., Estagira. Faleceu em 31 de Dezembro de 0322 a. C. Um dos mais importantes pensadores de todos os tempos. Texto extraído da obra "Ética a Nicômaco", O Livro das Virtudes - William J. Bennett. 1995 Cia. das Letras, São Paulo.
Assim como os motivos da Amizade diferem em espécie, também diferem as respectivas formas de afeição e de amizade. Existem três espécies de Amizade, e igual número de motivação do afecto, pois na esfera de cada espécie deve haver "afeição mútua mutuamente reconhecida".
Aqueles que têm Amizade desejam o bem do amigo de acordo com o motivo da sua amizade; desse modo, aqueles cujo motivo é a utilidade não têm Amizade realmente um pelo outro, mas apenas na medida em que recebem um bem do outro.
Aqueles cujo motivo é o prazer estão em caso semelhante: isto é, têm Amizade por pessoas de fácil graciosidade, não em virtude de seu carácter, mas porque elas lhes são agradáveis. Assim, aqueles cujo motivo da Amizade é a utilidade amam seus amigos pelo que é bom para si mesmo; aqueles cujo motivo é o prazer o fazem pelo que é prazeroso a si mesmo; ou seja, não em função daquilo que a pessoa estimada é, mas na medida em que ela é útil ou agradável. Essas Amizades são portanto circunstanciais: pois que o objecto não é amado por ser a pessoa que é, mas pelo que fornece de vantagem ou prazer, conforme o caso.
Tais Amizades são de facto muito passíveis de dissolução se as partes não permanecem iguais: isto é, os outros cessam de ter Amizade por eles quando deixam de ser agradáveis ou úteis. Ora, a natureza da utilidade não é de permanência, mas de constante variação: assim, quando o motivo que os tornou amigos desaparece, a Amizade também se dissolve; pois que existia apenas em relação àquelas circunstâncias...
A perfeita Amizade é a que subsiste entre aqueles que são bons e cuja similaridade consiste na bondade; pois esses desejam o bem do outro de maneira semelhante: na medida em que são bons (e são bons em si mesmo); e são especialmente amigos aqueles que desejam o bem a seus amigos por si mesmo, porque assim se sentem em relação a eles, e não por uma mera questão de circunstâncias; assim, a Amizade entre esses homens permanece enquanto eles são bons; e a bondade traz em si um princípio de permanência...
São poucas as probabilidades de Amizade dessa espécie, porque os homens dessa espécie são raros. Além disso, pressupõem-se todas as qualificações exigidas, essas Amizades exigem ainda tempo e intimidade; pois, como diz o provérbio, os homens não podem se conhecer "até que tenham comido juntos a quantidade de sal necessária"; nem podem de fato admitir um ao outro em sua intimidade, muito menos serem amigos, até que cada um se mostre ao outro e dê provas de ser objecto apropriado para a Amizade.
Aqueles que iniciam apressadamente uma troca de gestos amigáveis querem ser amigos mas não o são, a menos que sejam também objectos apropriados para a Amizade e se reconheçam mutuamente como tal: ou seja, o desejo de Amizade pode surgir rapidamente, mas não a amizade propriamente dita.
Chegaram até aqui... eu e os textos longos. Mas o tempo é algo de muito insignificante quando se fala de amigos, de amizade.
O desafio agora é outro - citando outro "velho amigo", Elmer Letterman - "Só existe uma coisa melhor do que fazer novos amigos: conservar os velhos"...
Da minha parte tenho a dizer que tem sido um prazer. Quanto a sentimentos, tive a sorte de alguém me ter escrito na minha fita: "As amizades não se escrevem... sentem-se!"
Que mais posso dizer?
Abraços & Beijos na testa...
..::carlos galveias::..
"Quem não vê bem uma palavra não pode ver bem uma alma"
Fernando Pessoa
segunda-feira, maio 17, 2004
(B)*enção das fitas
No passado sábado ocorreu mais um encontro académico reunindo os média e o marketing (mais dos primeiros que dos segundos) no qual foi notada a ausência dos audiovisuais. (Só não estranhei porque já começa a ser habitual)
Enquanto a grande maioria dos "jovens" finalistas se reunia em rituais de misturas religiosas e pagãs, um outro, bastante mais pequeno e muito pouco católico, patrocinava o debate de ideias (sim, leram bem. A vida não é só medida em graus).
O começo deste périplo de crânios começou com um repasto bem português, desde as tão tradicionais sardinhas até à importada picanha, tudo regado com o também bem tradicional vinho alentejano, antecedido de cerveja e secundado com outra bebida própria da ocasião (O café - ó vocês pensavam outras coisas?).
Depois do revestimento interno partimos para o verdadeiro encontro académico e demos por nós sentados numa livraria .- Ler.devagar - em plena tertúlia.
(Isto sim, esta é a forma de comemorar uma licenciatura em ciências da comunicação).
Do "Escola de Frankfurt", passando por "Saramago", "Luis Sepulveda", " Elihu Katz e Daniel Dayan", política nacional e internacional, tudo serviu de acompanhamento ao excelente chá de jasmim.
A troca de ideias foi profícua e contribuiu para cimentar amizades, já Aristóteles, na sua Retórica, escrevera "Um discurso deverá ser julgado pelo seu efeito sobre alguém".
Mas como o corpo não se alimenta só da mente, lá seguimos para outro repasto, este agora já na companhia dos outros colegas (não de todos, infelizmente, mas….. cada um sabe de si).
No antes, no durante e no depois, também ocorreram outras aventuras, mas essas eu não publico. Essas ficam nos segredos dos presentes.
Uma promessa voltou a ser reafirmada, a de um encontro aos vinte e nove de janeiro de todos os anos e nos "entretantos" uma maior presença neste espaço (tu sabes que é contigo que estou a falar).
A segunda já estou a cumprir, quanto à primeira, lá estarei.
F.Marinho
*Não sei o porquê do parêntesis mas ouvi dizer que é moda.
Enquanto a grande maioria dos "jovens" finalistas se reunia em rituais de misturas religiosas e pagãs, um outro, bastante mais pequeno e muito pouco católico, patrocinava o debate de ideias (sim, leram bem. A vida não é só medida em graus).
O começo deste périplo de crânios começou com um repasto bem português, desde as tão tradicionais sardinhas até à importada picanha, tudo regado com o também bem tradicional vinho alentejano, antecedido de cerveja e secundado com outra bebida própria da ocasião (O café - ó vocês pensavam outras coisas?).
Depois do revestimento interno partimos para o verdadeiro encontro académico e demos por nós sentados numa livraria .- Ler.devagar - em plena tertúlia.
(Isto sim, esta é a forma de comemorar uma licenciatura em ciências da comunicação).
Do "Escola de Frankfurt", passando por "Saramago", "Luis Sepulveda", " Elihu Katz e Daniel Dayan", política nacional e internacional, tudo serviu de acompanhamento ao excelente chá de jasmim.
A troca de ideias foi profícua e contribuiu para cimentar amizades, já Aristóteles, na sua Retórica, escrevera "Um discurso deverá ser julgado pelo seu efeito sobre alguém".
Mas como o corpo não se alimenta só da mente, lá seguimos para outro repasto, este agora já na companhia dos outros colegas (não de todos, infelizmente, mas….. cada um sabe de si).
No antes, no durante e no depois, também ocorreram outras aventuras, mas essas eu não publico. Essas ficam nos segredos dos presentes.
Uma promessa voltou a ser reafirmada, a de um encontro aos vinte e nove de janeiro de todos os anos e nos "entretantos" uma maior presença neste espaço (tu sabes que é contigo que estou a falar).
A segunda já estou a cumprir, quanto à primeira, lá estarei.
F.Marinho
*Não sei o porquê do parêntesis mas ouvi dizer que é moda.
quarta-feira, maio 12, 2004
Linda... Florbela
Bem... eu por vezes tenho destas coisas... hoje foi um dia especial... que tal celebrar com Florbela Espanca?? Parece bem??
E de quem é que os restantes amigos gostam???
Saudades e Amarguras
Saudades e amarguras
Tenho eu todos os dias,
Não podem pois adejar
Em meus versos, alegrias.
Saudades e amarguras
Tenho eu todas as horas,
Quem noites só conheceu,
Não pode cantar auroras.
... este é um dos meus favoritos dela...
FLORBELA ESPANCA
Poetisa: 1894 – 1930
por Rolando Galvão
EU QUERO AMAR, AMAR PERDIDAMENTE!
QUANDO TUDO ACONTECEU...
1894: A 8 de Dezembro, nasce Florbela Espanca em Vila Viçosa. - 1915: Casa com Alberto Moutinho. - 1919: Entra na Faculdade de Direito, em Lisboa. - 1919: Primeira obra, Livro de Mágoas. – 1923: Publica o Livro de Soror Saudade. – 1927: A 6 de Junho, morre Apeles, irmão da escritora, causando-lhe desgosto profundo. - 1930: Em Matosinhos, Florbela põe fim à vida. - 1931: Edição póstuma de Charneca em Flor, Reliquiae e Juvenilia e ainda das colectâneas de contos Dominó Negro e Máscara do Destino. Reedições dos dois primeiros livros editados. Verdadeiro começo da sua visibilidade generalizada.
FLOR BELA, RAÍZES E RAMOS
Vila Viçosa, final do ano de 1894, noite de sete para oito de Dezembro.
Antónia da Conceição Lobo sente as dores do parto. Nasce uma menina. Não vem ao encontro das alegrias da família. Não há assim lugar ao habitual regozijo de tais momentos. Não parece ter sido desejada por qualquer das partes. É baptizada como filha de pai incógnito. Avôs e avós também incógnitos. É-lhe posto o nome de Flor Bela de Alma da Conceição. Na literatura portuguesa será chamada Florbela Espanca. Apelido que receberá do pai, João Maria Espanca, já então levantado o véu encobridor. Curiosamente, o padre que a baptiza e a madrinha usam o mesmo apelido.
A mãe morre algum tempo depois.
Tem infância sem falta de carinhos e a sua subsistência não será ensombrada por insuficiências que atingem muitas das crianças que nascem em circunstâncias semelhantes.
O pai não a deixará desprovida de amparo. Ela própria assim o diz quando aos dez anos, em poema de parabéns de aniversário ao "querido papá da sua alma" escreve que a "mamã" cuida dela e do mano "mas se tu morreres/ somos três desgraçados" .
Será acarinhada pelas duas madrastas, como revelará na sua própria correspondência.
Ingressa no liceu de Évora. Num tempo em que poucas raparigas frequentam estudos, e bonita como é, apesar de umas tantas vezes afirmar o contrário, põe à roda a cabeça dos colegas.
Não são aqueles os primeiros versos. Antes já os escrevera com erros de ortografia. Naturalmente infantis, mas avançados em relação à idade. De algum modo, prenunciam o que virá depois.
Esta precocidade contrasta com um quê de desajustamento futuro, quando a sua escrita divergirá dos conceitos de poesia dos grupos do Orfeu, Presença e outras tendências do designado "Modernismo", e que emergem como as grandes referências literárias da época. Das quais Florbela parecerá arredada.
Inicialmente sem dificuldades económicas, como deixa perceber. Explicadora, trabalhará ensinando francês, inglês e outras matérias. Mais tarde, com vinte dois anos, irá cursar Direito na Universidade de Lisboa.
Publica vários poemas em jornais e revistas não propriamente dedicados à poesia, como seja Noticias de Évora e O Século ou de circulação local.
Edita os seus primeiros livros, Livro de mágoas em 1919, e em 1923 Livro de Soror Saudade, onde incluirá grande parte da produção anterior.
Refere o seu Alentejo e os locais ligados às suas origens, e exalta a Pátria em alguns poemas. Mas a sua escrita situar-se-á sobretudo no campo da paixão humana.
Contrai matrimónio por três vezes. Do primeiro marido, Alberto Moutinho, usa o apelido em alguns escritos, nomeadamente correspondência. Do terceiro marido, Mário Lage, juntará o apelido à assinatura usual, nas traduções que efectuará. Do segundo, António Guimarães, não parece haver reminiscências explicitas nos escritos de Florbela, que lhe terá dedicado obra que publica como Livro de Soror Saudade, titulo diferente do projectado e esquecendo a dedicatória.
AS FACES DUMA PERSONALIDADE
Como dizem vários estudiosos da sua pessoa e obra, Florbela surge desligada de preocupações de conteúdo humanista ou social. Inserida no seu mundo pequeno burguês, como evidencia nos vários retratos que de si faz ao longo dos seus escritos.
Não manifesta interesse pela política ou pelos problemas sociais. Diz-se conservadora.
Uma quase inventariação das suas diferentes personalidades desenha-se nas palavras de um dos seus contos, a que deu o titulo À margem de um soneto que integra o volume intitulado O Dominó Preto.
Inicia-o falando duma poetisa, a dizer que "vestida de veludo branco e negro, estendeu a mão delgada, onde as unhas punham um reflexo de jóias....", informando um visitante de que tinha fechado o seu "livro de versos... com um belo soneto!"
Segue, "num olhar... afogado em sonho" e "numa voz macia e triste" a leitura do soneto e termina com "o mal de ser sozinha"...suportando "o pavoroso e atroz mal de trazer/ tantas almas a rir dentro da minha!...."
O conto continua em tons e quadros que Florbela frequentemente considera como de si própria e aqui atribui a suposta romancista brasileira: "feia, nada elegante, inteligente, mas com o talento, o espírito e a graça, e sobretudo o encanto, duma imaginação extraordinária, palpitante de vida, apaixonada e colorida, sempre variada, duma pujança assombrosa."
Pondo na mente do marido da personagem, o seu próprio discurso, vai enunciando as "almas diversas que eram dela" e que "ocultava dentro de si".
Entrevê a personagem "imaculada, ingénua, fria, longínqua"; "inacessível e sagrada" de "imaterial beleza" e "a morrer virginal e sorridente".
Referindo um outro imaginário romance apresenta-se "ardente e sensual, rubra de paixão, endoidecendo homens, perdendo honras..."
Com alusão a terceiro presumível livro, qualifica-se "céptica e desiludida, irónica, desprezando tudo, desdenhando tudo, passando indiferente em todos os caminhos, fazendo murchar todas as coisas belas". Mente "dia e noite só pelo prazer de mentir" e "beija doidamente um amante doido."
Quem, ao ler a sua obra poética, a sua prosa, as suas cartas, os seus outros escritos, não a vê usar um milhar de vezes para si própria, termos semelhantes, ultrapassando até tais qualificativos e exageros?
Antes do final ainda a exaltação do ser poeta, que se pode considerar uma das suas constantes:
"- As almas das poetisas são todas feitas de luz, como as dos astros: não ofuscam, iluminam...."
Quem é realmente Florbela?
Ninguém é definível numa só dimensão, num só conjunto de qualidades. Todo o ser é uma intersecção de adjectivações diferentes e até opostas, ensina-me, desde a juventude, o meu amigo Diogo de Sousa, que cursava Filosofia.
No caso da poetisa tem a particularidade de ser ela própria a evidenciá-lo, permanentemente e sem constrangimentos. Parafraseando António José Saraiva e Oscar Lopes na História da Literatura Portuguesa: estimula e antecede o "movimento de emancipação literária da mulher" que romperá "a frustração não só feminina como masculina, das nossas opressivas tradições patriarcais...."
Na sua escrita é notável, como dizem os mesmos mestres, "a intensidade de um transcendido erotismo feminino". Tabu até então, e ainda para além do seu tempo, em dizeres e escreveres femininos.
Os referidos autores, em capitulo sob o titulo Do simbolismo ao modernismo, enumerando várias tendências como "método de exposição ... pedagógica" incluem Florbela num grupo que designam como "Outros poetas". Qualificam-na como "sonetista com laivos parnasianos esteticistas" e "uma das mais notáveis personalidades líricas".
O seu egocentrismo, que não retira beleza à sua poesia, é por demais evidente para não ser referenciado praticamente por todos.
Sedenta de glória, diz Henrique Lopes de Mendonça, transcrito por Carlos Sombrio.
Na sua escrita há um certo numero de palavras em que insiste incessantemente. Antes de mais, o EU, presente, dir-se-á, em quase todas as peças poéticas. Largamente repetidos vocábulos reflexos da paixão: alma, amor, saudade, beijos, versos, poeta, e vários outros, e os que deles derivam.
Escritos de âmbito para além dos que caracterizam essa paixão não são abundantes, particularmente na obra poética. Salvo no que se refere ao seu Alentejo.
Não se coloca como observadora distante, mesmo quando tal parece, exterior a factos, ideias, acontecimentos.
Curiosa é a posição da poetisa quanto ao casamento. Mau grado dizer que a única desculpa que se atribui é ter casado por amor (!!!), várias vezes se afirma inteiramente contra, apesar de ter contraído matrimónio por três vezes...
Entre os poetas seus preferidos destacam-se António Nobre, Augusto Gil, Guerra Junqueiro, José Duro e outros de correntes próximas. Interessa-se também por Antero.
Pela não publicação das suas obras, ora se mostra descontente por não encontrar editor para os livros que, após os dois primeiros, deseja dar a público, ora pretende mostrar-se desinteressada, mesmo desdenhosa pelo facto. Embora o desgosto seja saliente.
Passados perto de setenta anos sobre a sua morte são falados comportamentos menos ortodoxos em relação à moral sexual do seu tempo. Algumas expressões de emocionalidade um tanto excessiva para a época, embora não exclusivas da escritora, ajudam a suspeita.
Lembramos a sua correspondência e as referências ao irmão, Apeles. Os seus excessos verbais parece não passarem disso mesmo - imoderação para exprimir uma paixão. Aqui, exaltação fora do comum de um amor fraternal mas que não destoa do falar dos seus sentimentos.
Semelhante escrever na correspondência com uma amiga. Afinal nunca esteve junto dessa mesma amiga e apenas a viu em retrato.
Esses limites alargados na expressão do amor, da amizade e das afeições, são uma constante.
Fernanda de Castro, em escrito retido por Carlos Sombrio, explica as suas contradições, ao dizer" não soube viver sem quebrar preconceitos, algemas, correntes - e não teve coragem de os quebrar todos".
Florbela, poetisa, não pode ser separada da sua condição de mulher, das suas paixões, da sua maneira de ser, da sua vida, das suas contradições, humildade e orgulho, preconceitos, sua presença e ausência, seus amores e desamores, explica-me a minha jovem amiga Clara Santos, florbelista militante.
A sua única preocupação é ela própria, o amor, a paixão... o querer e o não querer. A par duma vida pouco comum para os cânones vigentes - dois divórcios e três casamentos em cerca de quinze anos - essa relação mulher-paixão e a exaltação ao exprimir-se sobre si própria, podem ter contribuído para os conceitos aludidos.
Repare-se neste começo de um dos seus mais conhecidos sonetos:
Eu quero amar, amar perdidamente !
Amar só por amar: Aqui ... além...
Mais Este e Aquele, o Outro e toda a gente ...
Amar ! Amar! E não amar ninguém !
e no final da quadra seguinte
Quem disser que se pode amar alguém
Durante a vida inteira é porque mente!
Na época, conservadora como diz ser, leva a crer muito provavelmente, num viver que nos factos se coadunará e não se distanciará dos conceitos morais e sociais vigentes.
FLORBELA, A ESCRITORA E O CULTO
Pergunto-me o porquê da visibilidade de Florbela e da sua aceitação por um público muito mais vasto que o de muitos outros escritores seus contemporâneos, anteriores e posteriores, de qualidade se não superior, pelo menos semelhante, e de interesse e caracter mais universalista, com preocupações capazes de fazerem apelo a um mais vasto e amplo leque de sensibilidades.
Se a sua obra apresenta inegável interesse e beleza, não deixa de constituir surpresa para alguns críticos, o impacto junto do público leitor, comparado com o de outros autores de igual valia e que fora dos meios ditos intelectuais pouco ou nada são conhecidos.
Abrimos a referida História da Literatura Portuguesa, contamos os vários nomes de escritores aí citados na mesma época, atentamos na análise deles feita pelos insuspeitos autores e constatemos o numero dos que praticamente continuam envoltos numa bruma. Mesmo para leitores de mais largos voos muitos não passam de meros desconhecidos.
Após vasta inventariação de publicações, José Augusto França, na sua obra Os anos vinte em Portugal, indicando umas dezenas de escritores, a Florbela se refere dizendo-a "escondida de todos", acrescentando todavia que "foi ela o caso de mais profunda criação entre as mulheres que publicaram nos anos 20 portugueses".
Para outros não é um astro da grandeza de vários dos seus contemporâneos. Estará um tanto em atraso, quer quanto à forma, quer quanto às suas preocupações. Como explicar então que seja qualificada por muitos como um dos vultos do século - e o seja, pela projecção que acaba por atingir?
Hernâni Cidade referirá "a violenta contradição entre o conceito de poesia de duas épocas distantes ou próximas".
Alguns críticos entrelinham a análise do seu comportamento e da sua obra com dizeres onde se pressente um esforço para evitarem uma sentença relativamente dura.
Natália Correia, em longo prefácio a uma edição de Diário do último ano fala do "coquetismo patético" e refere a sua "poesia maquilhada com langores de estrela de cinema mudo, carregada de pó de arroz". E continua, exagerando um tanto, dizendo que a escritora "estende-se na chaise-longue dos seus quebrantos de diva de versos. Muito a preceito da corte dos literatos menores. Uma cadelinha de luxo acarinhada no chá-das-cinco das senhoras do Modas e Bordados e do Portugal Feminino para explicar que isso nasce da sua insensibilidade "a rupturas engendradas pelas crises do discurso lógico masculino".
Porquê então tal expansão?
O seu culto começa nela própria.
Leia-se o poema, cantado por conhecido grupo musical e um dos mais belos:
Ser poeta é ser mais alto, é ser maior
Do que os homens! Morder como quem beija!
É ser mendigo e dar como quem seja
Rei do Reino de Aquém e Alem Dor!
.............................
É ter cá dentro um astro que flameja,
É ter garras e asas de condor!
.............................
É ter fome, é ter sede de Infinito!
............................
É condensar o mundo num só grito!
............................
E quantas e quantas vezes Florbela nos recorda que é poeta! E com que euforia:
Sonho que sou a Poetisa eleita,
Aquela que diz tudo e tudo sabe,
Que tem a inspiração pura e perfeita,
Que reúne num verso a imensidade!
Sonho que um verso meu tem claridade
Para encher todo o mundo! E que deleita
Mesmo aqueles que morrem de saudade!
Mesmo os de alma profunda e insatisfeita!
Poucos poetas o farão tão repetidamente...
De modo algum pomos de lado a beleza do que escreve, da maneira como se exprime, e do que ocupa a sua escrita.
Sem excluir a qualidade literária, não serão porém inteiramente estranhos ao multiplicar da sua leitura, aspectos que de certo modo lhe serão alheios. Entre outros, o auto retrato da sua vida que desenha um tanto distante do ordenamento e preconceitos sociais da sua época, as variadas contradições, ou aparência de contradições (como admite José Régio) a tragédia da sua morte, o seu empenhamento na publicação, esforçado e continuado, os locais onde vive, propensos à glorificação dos naturais ou próximos, o seu proto-feminismo diferenciado do que se lhe seguirá uns anos mais tarde, mas capaz de chamar a atenção.
Um nome, Guido Batelli, italiano, professor da Universidade de Coimbra, não poderá ser esquecido. Ao traduzir para a sua língua vários dos poemas de Florbela, cria um facto que não se pode dizer muito comum .
E admirando-a sinceramente, contribuirá para a edição (póstuma) de Charneca em Flor, Reliquiae e Juvenilia. É provavelmente com a sua intervenção que se fazem as primeiras reedições do Livro de Mágoas e do Livro de Soror Saudade.
Régio, sobre o silêncio da Presença, de que diz ter vergonha, explica que só mais tarde a conhece. Chama-lhe "poesia viva" que "nasce, vive e se alimenta do seu (...) porventura demasiado real caso humano". Acompanhará sucessivas reedições de uma parte dos poemas com extenso e elucidativo prefácio, datado de 1950, onde faz análise valiosíssima, exaltando a obra e destacando alguns dos mais brilhantes momentos da poetisa...
Mas é, possivelmente, António Ferro que, em artigo do Diário de Noticias, logo em Janeiro de 1931, chama a atenção para a poesia de Florbela e provoca um acordar de críticos e leitores que até ao presente se não extingue.
POESIA. CONCEITOS E PRECONCEITOS DE AMOR
"Beija-me as mãos, Amor, devagarinho", diz Florbela. Entretanto, o que está a acontecer no resto do mundo? Consulta a Tábua Cronológica.
É a poesia que fará de Florbela o vulto que é. Quase sempre em forma de soneto.
Salvo umas tantas excepções. Algumas quadras incluídas por Rui Guedes em valiosa edição abrangendo a totalidade ou quase da poesia de Florbela .
Uma delas, com um certo sabor à chamada quadra popular:
Tenho por ti uma paixão
Tão forte tão acrisolada,
Que até adoro a saudade
Quando por ti é causada
ou esta
Que filtro embriagante
Me deste tu a beber?
Até me esqueço de mim
E não te posso esquecer...
O seu Alentejo merece-lhe palavras de exaltação. Em soneto a que chama No meu Alentejo que inclui em carta à directora de Modas e Bordados exprime-a nos tercetos finais
Tudo é tranquilo e casto e sonhador...
Olhando esta paisagem que é uma tela
De Deus, eu penso então: Onde há pintor
Onde há artista de saber profundo,
Que possa imaginar coisa mais bela,
Mais delicada e linda neste Mundo?
Escreve também poemas de sentido patriótico. Um deles, dirigido às mães, apelando que calem as suas mágoas pelos filhos que lutam e morrem na guerra em defesa da Pátria, e alguns outros de sentido semelhante.
Mas Florbela lembra claramente que o que a preocupa é o Amor, e os ingredientes que romanticamente lhe são inerentes: a solidão, a tristeza, a saudade, a sedução, a evocação da morte, entre outros... E o desejo. Mesmo quando trata outros temas, diz-me alguém que a admira. Olhemos uma das quadras do soneto que intitulou Toledo
As tuas mãos tacteiam-me a tremer...
Meu corpo de âmbar, harmonioso e moço,
É como um jasmineiro em alvoroço,
Ébrio de Sol, de aroma, de prazer!
O grande paradoxo. O amor, como muitas vezes se lhe refere, sugere um sentir onde o erotismo é componente permanente. Exaltado em vários escritos, noutros pretende ser limpo do que na época se consideram impurezas.
Após os vários casamentos, diz desejar morrer virginalmente.
Tudo produto duma moral que interditava à mulher exprimir o seu prazer sexual, segreda-me uma outra minha amiga, para quem Florbela é o grande expoente da escrita no feminino. As sugestões mais ousadas sobre sexo eram tidas como degradação ou, complacentemente, como provocação, recorda-me.
Pergunta que não terá resposta fácil é saber se Florbela escreve, aproximando-se do explícito, porque pretende romper com os comportamentos tidos como convenientes e dentro do moralmente correcto.
Olhamos o soneto Passeio ao Campo onde começa
Meu Amor! Meu Amante! Meu Amigo! Colhe a hora que passa, hora divina,
bebe-a dentro de mim, bebe-a comigo!
e depois de referir a "cinta esbelta e fina..." e outros atributos da sua própria elegância física, continua
E à volta, Amor... tornemos, nas alfombras
Dos caminhos selvagens e escuros,
Num astro só as nossas duas sombras...
Num outro
Se tu viesses ver-me hoje à tardinha,
A essa hora dos mágicos cansaços,
Quando a noite de manso se avizinha,
E me prendesses toda nos teus braços...
para concluir
E é como um cravo ao sol a minha boca...
Quando os olhos se me cerram de desejo...
E os meus braços se estendem para ti...
O erotismo não fica por aqui. Num outro poema diz:
Sonhei que era a tua amante querida
......................................................
........................................anelante
estava nos teus braços num instante,
fitando com amor os olhos teus
E ainda em sentido semelhante, estes tercetos
Beija-me as mãos, Amor, devagarinho...
Como se os dois nascêssemos irmãos,
Aves, cantando, ao sol, no mesmo ninho...
Beija-mas bem!...Que fantasia louca
Guardar assim, fechados, nestas mãos,
Os beijos que sonhei pra minha boca!...
Mau grado dizeres que, pelo sensualismo, sugerem um sentido libertário, uma interpretação do conjunto da sua obra faz pensar em posição cultural divergente.
Contraditoriamente com essa sensualidade sempre presente, afirma não poder olhar para o relacionamento sexual sem um sentimento de impureza, de brutalidade. Em alguns trechos, onde mais fortemente sugerido, as mulheres são impuras, megeras ou sujeito de outros qualificativos semelhantes.
O casamento e a posse são brutalidades, afirma e repete.
A PROSA
A prosa de Florbela exprime-se através do conto e de um diário que antecede a sua morte e em cartas várias, de natureza familiar umas, outras tratando de questões relacionadas com a sua produção literária, quer num sentido interrogativo quanto à sua qualidade, quer quanto a aspectos mais práticos, como a sua publicação. Nas diferentes manifestações epistolares sobressaem qualidades que nem sempre estão presentes na restante produção em prosa - naturalidade e simplicidade.
Nos contos, compilados em dois volumes, O Dominó Preto e As Máscaras do Destino, muitas vezes um certo sentido autobiográfico, intimista.
No já referido À margem de um soneto, como atrás dizemos, parece pretender retratar as diferentes personalidades em que se vê, contraditórias e provocantes em relação à época
Num outro conto, Amor de outrora, pressente-se um recordar de ocorrências da sua vida e dos seus enganos e desenganos de amor, desde o primeiro ao terceiro casamento. Várias cartas, para os maridos e para os apaixonados que aparentemente pretende afastar, e para o pai, em que procura justificar algumas situações, ajudam a este entendimento.
Em Crime do Pinhal, ao lado dos "lavadores de honra" pelo assassinato de um sedutor, duas mães no afecto da mesma criança. As suas "madrastas mães" cujo grande e simultâneo afecto por Florbela é retribuído?
No inicio de As Máscaras do Destino, dedicatória a Apeles, o seu Morto, para quem mais uma vez palavras de exaltação e dor, que complementa em O Aviador, visão mítica da morte do irmão amado.
Ao longo dos contos encontram-se frases de grande beleza e força. As expressões de desejo, carregadas de erotismo, atribuídas à personagem do segundo dos referidos contos – que, de algum modo, exprimem as suas contradições na transição para a libertação da mulher. Não podemos porém deixar de os considerar por vezes carecendo de uma certa densidade. Um excessivo uso de palavras e imagens, que pouco ou nada acrescentam ao que pretende sugerir, contribui para uma menos conseguida "análise profunda dos sentimentos e paixões", observa Y. Centeno. E, como nota a mesma escritora, quase permanente é a qualificação das mulheres em puras e impuras, em excelentes e megeras.
As suas cartas, sem a pretensão da criação literária, e talvez por isso, a par da informação factual, apresentam uma visão muito menos enfeitada e artificiosa da sua vivência. Permitem conhecê-la melhor e exprimem estados de alma mais próximos duma humanidade real do que a sua prosa formal e, até, alguns dos seus momentos poéticos.
Sobressaem as que envia à sua amiga Júlia Alves, com quem nunca se encontrará, com quem troca impressões sobre os mais variados assuntos e a quem expõe a sua alma à medida que o relacionamento vai progredindo. Numa delas dirá: "preciso tanto de ser embalada devagarinho... suavemente... como uma criança pequenina, sonhando de olhos fechados, num regaço carinhoso e quente!..." O que talvez ajude a compreender a sua vida e a sua morte.
Numa outra, já após o primeiro casamento, afirma - e isto é por ela redito e contradito: "uma das coisas melhores da nossa vida... é o amor, o grande e discutido amor... " acrescentando umas linhas a seguir que "no entanto, o casamento é brutal, como a posse é sempre brutal..."
Escreve à sua amiga com frequência que não deixa de surpreender. Em dias seguidos. Num mesmo dia três missivas distintas. Na que se presume ser a última, um pouco menos de um ano depois da primeira, e já sem o calor que se pressente nas anteriores, agradece dizendo que não esquece o ter-se sentido compreendida e estimada
Em correspondência dirigida a outras personalidades mostra-se triste pois não vê facilitado o caminho para a publicação dos seus livros.
A Raul Proença deixa claro o seu desânimo com o que este pensa dos seus versos, juntando outros sonetos perguntando se desses gosta. O escritor virá a proporcionar-lhe a publicação (Livro de Mágoas).
Traduzirá dois livros (e possivelmente outros), um de Pierre Benoit, Mademoiselle de la Ferté, que constitui leitura obrigatória dos adolescentes da década seguinte à sua morte, e Dois Noivados de Clambol, editados pela Liv. Civilização, do Porto. Assina as traduções como Florbela Espanca Lage. Antes, em várias circunstâncias, usara Florbela Moutinho, apelido do primeiro marido.
O FIM
No último ano de vida elabora um Diário, onde deixará anotações até escassos dias antes do trágico fim. Prefácio a esse fim.
Logo no início explica não ter qualquer objectivo ao escrevê-lo.
Pouco depois do começo espera que "quando morrer é possível que alguém" ao lê-lo "se debruce com um pouco de piedade, um pouco de compreensão," sobre o que foi ou julgou ser. "E realize o que eu não pude: conhecer-me".
Define-se "honesta sem preconceitos, amorosa sem luxúria, casta sem formalidades, recta sem princípios, e sempre viva", o que encaminha para algumas das questões que se põem..
Depois de recordar os nomes de companheiros e mostrar uma vez mais o amor pelo irmão, Apeles, aviador, cujo desaparecimento em desastre do seu avião a faz sentir mais só. Diz não compreender o medo que a morte causa à jovem autora de um Diário de que reproduz algumas frases.
Examina-se diante do espelho e dizendo-se "grosseira e feia, grotesca e miserável" põe em dúvida se saberia fazer versos. Colocando-nos uma vez mais em face das contradições que a atormentam permanentemente e que exprime numa outra frase: "Viver é não saber que se vive".
À medida que caminha para o final as anotações são cada vez mais raras e curtas.
Afirma que as cartas de amor que escreveu resultavam apenas da sua necessidade de fazer frases. E em oposição frontal com o dito páginas atrás escreve "se os outros não me conhecem, eu conheço-me".
Poucos dias antes de morrer interroga-se "que importa o que está para além?" Responde, repetindo o que diz no soneto A um moribundo: seja o que for será melhor que o mundo e que a vida.
A morte anunciada ao longo da sua escrita ocorrerá pouco depois. Põe fim à vida em 8 de Dezembro de 1930, dia em que faz trinta e seis anos, em Matosinhos, onde vive. Aí é enterrada sendo mais tarde trasladada para a sua terra natal.
Com Florbela morre, não talvez a maior poetisa do seu tempo, mas uma das que mais agudamente e sem temor exprimiu as grandes contradições da sensibilidade feminina nas suas paixões. Ao mesmo tempo, com uma certa ingenuidade, impregnada das verdades simples ou complexas do que é a mulher, na convergência da cultura e do ser.
Que conduz Florbela para a morte?
Fernanda de Castro, em escrito citado por Carlos Sombrio, sintetiza a resposta: "Porque nunca soube pôr de acordo o seu corpo, o seu espírito e a sua alma".
Do acontecimento os jornais quase não dão notícia. Fá-lo-ão a partir daí.
Postumamente são publicadas, por iniciativa do professor Guido Batelli, como atrás se diz, os dois livros de poemas Charneca em Flor e Reliquiae, duas colectâneas de contos, Dominó Negro e Máscara do Destino e uma outra de poesia, Juvenilia.
Começo de uma sucessão de reedições que no caso da poesia alcança já, em alguns casos, a ordem das três dezenas, ou mais, se recordarmos a dispersão editorial.
E alem das de Guido Batelli, algumas traduções, não apenas para italiano.
E de quem é que os restantes amigos gostam???
Saudades e Amarguras
Saudades e amarguras
Tenho eu todos os dias,
Não podem pois adejar
Em meus versos, alegrias.
Saudades e amarguras
Tenho eu todas as horas,
Quem noites só conheceu,
Não pode cantar auroras.
... este é um dos meus favoritos dela...
FLORBELA ESPANCA
Poetisa: 1894 – 1930
por Rolando Galvão
EU QUERO AMAR, AMAR PERDIDAMENTE!
QUANDO TUDO ACONTECEU...
1894: A 8 de Dezembro, nasce Florbela Espanca em Vila Viçosa. - 1915: Casa com Alberto Moutinho. - 1919: Entra na Faculdade de Direito, em Lisboa. - 1919: Primeira obra, Livro de Mágoas. – 1923: Publica o Livro de Soror Saudade. – 1927: A 6 de Junho, morre Apeles, irmão da escritora, causando-lhe desgosto profundo. - 1930: Em Matosinhos, Florbela põe fim à vida. - 1931: Edição póstuma de Charneca em Flor, Reliquiae e Juvenilia e ainda das colectâneas de contos Dominó Negro e Máscara do Destino. Reedições dos dois primeiros livros editados. Verdadeiro começo da sua visibilidade generalizada.
FLOR BELA, RAÍZES E RAMOS
Vila Viçosa, final do ano de 1894, noite de sete para oito de Dezembro.
Antónia da Conceição Lobo sente as dores do parto. Nasce uma menina. Não vem ao encontro das alegrias da família. Não há assim lugar ao habitual regozijo de tais momentos. Não parece ter sido desejada por qualquer das partes. É baptizada como filha de pai incógnito. Avôs e avós também incógnitos. É-lhe posto o nome de Flor Bela de Alma da Conceição. Na literatura portuguesa será chamada Florbela Espanca. Apelido que receberá do pai, João Maria Espanca, já então levantado o véu encobridor. Curiosamente, o padre que a baptiza e a madrinha usam o mesmo apelido.
A mãe morre algum tempo depois.
Tem infância sem falta de carinhos e a sua subsistência não será ensombrada por insuficiências que atingem muitas das crianças que nascem em circunstâncias semelhantes.
O pai não a deixará desprovida de amparo. Ela própria assim o diz quando aos dez anos, em poema de parabéns de aniversário ao "querido papá da sua alma" escreve que a "mamã" cuida dela e do mano "mas se tu morreres/ somos três desgraçados" .
Será acarinhada pelas duas madrastas, como revelará na sua própria correspondência.
Ingressa no liceu de Évora. Num tempo em que poucas raparigas frequentam estudos, e bonita como é, apesar de umas tantas vezes afirmar o contrário, põe à roda a cabeça dos colegas.
Não são aqueles os primeiros versos. Antes já os escrevera com erros de ortografia. Naturalmente infantis, mas avançados em relação à idade. De algum modo, prenunciam o que virá depois.
Esta precocidade contrasta com um quê de desajustamento futuro, quando a sua escrita divergirá dos conceitos de poesia dos grupos do Orfeu, Presença e outras tendências do designado "Modernismo", e que emergem como as grandes referências literárias da época. Das quais Florbela parecerá arredada.
Inicialmente sem dificuldades económicas, como deixa perceber. Explicadora, trabalhará ensinando francês, inglês e outras matérias. Mais tarde, com vinte dois anos, irá cursar Direito na Universidade de Lisboa.
Publica vários poemas em jornais e revistas não propriamente dedicados à poesia, como seja Noticias de Évora e O Século ou de circulação local.
Edita os seus primeiros livros, Livro de mágoas em 1919, e em 1923 Livro de Soror Saudade, onde incluirá grande parte da produção anterior.
Refere o seu Alentejo e os locais ligados às suas origens, e exalta a Pátria em alguns poemas. Mas a sua escrita situar-se-á sobretudo no campo da paixão humana.
Contrai matrimónio por três vezes. Do primeiro marido, Alberto Moutinho, usa o apelido em alguns escritos, nomeadamente correspondência. Do terceiro marido, Mário Lage, juntará o apelido à assinatura usual, nas traduções que efectuará. Do segundo, António Guimarães, não parece haver reminiscências explicitas nos escritos de Florbela, que lhe terá dedicado obra que publica como Livro de Soror Saudade, titulo diferente do projectado e esquecendo a dedicatória.
AS FACES DUMA PERSONALIDADE
Como dizem vários estudiosos da sua pessoa e obra, Florbela surge desligada de preocupações de conteúdo humanista ou social. Inserida no seu mundo pequeno burguês, como evidencia nos vários retratos que de si faz ao longo dos seus escritos.
Não manifesta interesse pela política ou pelos problemas sociais. Diz-se conservadora.
Uma quase inventariação das suas diferentes personalidades desenha-se nas palavras de um dos seus contos, a que deu o titulo À margem de um soneto que integra o volume intitulado O Dominó Preto.
Inicia-o falando duma poetisa, a dizer que "vestida de veludo branco e negro, estendeu a mão delgada, onde as unhas punham um reflexo de jóias....", informando um visitante de que tinha fechado o seu "livro de versos... com um belo soneto!"
Segue, "num olhar... afogado em sonho" e "numa voz macia e triste" a leitura do soneto e termina com "o mal de ser sozinha"...suportando "o pavoroso e atroz mal de trazer/ tantas almas a rir dentro da minha!...."
O conto continua em tons e quadros que Florbela frequentemente considera como de si própria e aqui atribui a suposta romancista brasileira: "feia, nada elegante, inteligente, mas com o talento, o espírito e a graça, e sobretudo o encanto, duma imaginação extraordinária, palpitante de vida, apaixonada e colorida, sempre variada, duma pujança assombrosa."
Pondo na mente do marido da personagem, o seu próprio discurso, vai enunciando as "almas diversas que eram dela" e que "ocultava dentro de si".
Entrevê a personagem "imaculada, ingénua, fria, longínqua"; "inacessível e sagrada" de "imaterial beleza" e "a morrer virginal e sorridente".
Referindo um outro imaginário romance apresenta-se "ardente e sensual, rubra de paixão, endoidecendo homens, perdendo honras..."
Com alusão a terceiro presumível livro, qualifica-se "céptica e desiludida, irónica, desprezando tudo, desdenhando tudo, passando indiferente em todos os caminhos, fazendo murchar todas as coisas belas". Mente "dia e noite só pelo prazer de mentir" e "beija doidamente um amante doido."
Quem, ao ler a sua obra poética, a sua prosa, as suas cartas, os seus outros escritos, não a vê usar um milhar de vezes para si própria, termos semelhantes, ultrapassando até tais qualificativos e exageros?
Antes do final ainda a exaltação do ser poeta, que se pode considerar uma das suas constantes:
"- As almas das poetisas são todas feitas de luz, como as dos astros: não ofuscam, iluminam...."
Quem é realmente Florbela?
Ninguém é definível numa só dimensão, num só conjunto de qualidades. Todo o ser é uma intersecção de adjectivações diferentes e até opostas, ensina-me, desde a juventude, o meu amigo Diogo de Sousa, que cursava Filosofia.
No caso da poetisa tem a particularidade de ser ela própria a evidenciá-lo, permanentemente e sem constrangimentos. Parafraseando António José Saraiva e Oscar Lopes na História da Literatura Portuguesa: estimula e antecede o "movimento de emancipação literária da mulher" que romperá "a frustração não só feminina como masculina, das nossas opressivas tradições patriarcais...."
Na sua escrita é notável, como dizem os mesmos mestres, "a intensidade de um transcendido erotismo feminino". Tabu até então, e ainda para além do seu tempo, em dizeres e escreveres femininos.
Os referidos autores, em capitulo sob o titulo Do simbolismo ao modernismo, enumerando várias tendências como "método de exposição ... pedagógica" incluem Florbela num grupo que designam como "Outros poetas". Qualificam-na como "sonetista com laivos parnasianos esteticistas" e "uma das mais notáveis personalidades líricas".
O seu egocentrismo, que não retira beleza à sua poesia, é por demais evidente para não ser referenciado praticamente por todos.
Sedenta de glória, diz Henrique Lopes de Mendonça, transcrito por Carlos Sombrio.
Na sua escrita há um certo numero de palavras em que insiste incessantemente. Antes de mais, o EU, presente, dir-se-á, em quase todas as peças poéticas. Largamente repetidos vocábulos reflexos da paixão: alma, amor, saudade, beijos, versos, poeta, e vários outros, e os que deles derivam.
Escritos de âmbito para além dos que caracterizam essa paixão não são abundantes, particularmente na obra poética. Salvo no que se refere ao seu Alentejo.
Não se coloca como observadora distante, mesmo quando tal parece, exterior a factos, ideias, acontecimentos.
Curiosa é a posição da poetisa quanto ao casamento. Mau grado dizer que a única desculpa que se atribui é ter casado por amor (!!!), várias vezes se afirma inteiramente contra, apesar de ter contraído matrimónio por três vezes...
Entre os poetas seus preferidos destacam-se António Nobre, Augusto Gil, Guerra Junqueiro, José Duro e outros de correntes próximas. Interessa-se também por Antero.
Pela não publicação das suas obras, ora se mostra descontente por não encontrar editor para os livros que, após os dois primeiros, deseja dar a público, ora pretende mostrar-se desinteressada, mesmo desdenhosa pelo facto. Embora o desgosto seja saliente.
Passados perto de setenta anos sobre a sua morte são falados comportamentos menos ortodoxos em relação à moral sexual do seu tempo. Algumas expressões de emocionalidade um tanto excessiva para a época, embora não exclusivas da escritora, ajudam a suspeita.
Lembramos a sua correspondência e as referências ao irmão, Apeles. Os seus excessos verbais parece não passarem disso mesmo - imoderação para exprimir uma paixão. Aqui, exaltação fora do comum de um amor fraternal mas que não destoa do falar dos seus sentimentos.
Semelhante escrever na correspondência com uma amiga. Afinal nunca esteve junto dessa mesma amiga e apenas a viu em retrato.
Esses limites alargados na expressão do amor, da amizade e das afeições, são uma constante.
Fernanda de Castro, em escrito retido por Carlos Sombrio, explica as suas contradições, ao dizer" não soube viver sem quebrar preconceitos, algemas, correntes - e não teve coragem de os quebrar todos".
Florbela, poetisa, não pode ser separada da sua condição de mulher, das suas paixões, da sua maneira de ser, da sua vida, das suas contradições, humildade e orgulho, preconceitos, sua presença e ausência, seus amores e desamores, explica-me a minha jovem amiga Clara Santos, florbelista militante.
A sua única preocupação é ela própria, o amor, a paixão... o querer e o não querer. A par duma vida pouco comum para os cânones vigentes - dois divórcios e três casamentos em cerca de quinze anos - essa relação mulher-paixão e a exaltação ao exprimir-se sobre si própria, podem ter contribuído para os conceitos aludidos.
Repare-se neste começo de um dos seus mais conhecidos sonetos:
Eu quero amar, amar perdidamente !
Amar só por amar: Aqui ... além...
Mais Este e Aquele, o Outro e toda a gente ...
Amar ! Amar! E não amar ninguém !
e no final da quadra seguinte
Quem disser que se pode amar alguém
Durante a vida inteira é porque mente!
Na época, conservadora como diz ser, leva a crer muito provavelmente, num viver que nos factos se coadunará e não se distanciará dos conceitos morais e sociais vigentes.
FLORBELA, A ESCRITORA E O CULTO
Pergunto-me o porquê da visibilidade de Florbela e da sua aceitação por um público muito mais vasto que o de muitos outros escritores seus contemporâneos, anteriores e posteriores, de qualidade se não superior, pelo menos semelhante, e de interesse e caracter mais universalista, com preocupações capazes de fazerem apelo a um mais vasto e amplo leque de sensibilidades.
Se a sua obra apresenta inegável interesse e beleza, não deixa de constituir surpresa para alguns críticos, o impacto junto do público leitor, comparado com o de outros autores de igual valia e que fora dos meios ditos intelectuais pouco ou nada são conhecidos.
Abrimos a referida História da Literatura Portuguesa, contamos os vários nomes de escritores aí citados na mesma época, atentamos na análise deles feita pelos insuspeitos autores e constatemos o numero dos que praticamente continuam envoltos numa bruma. Mesmo para leitores de mais largos voos muitos não passam de meros desconhecidos.
Após vasta inventariação de publicações, José Augusto França, na sua obra Os anos vinte em Portugal, indicando umas dezenas de escritores, a Florbela se refere dizendo-a "escondida de todos", acrescentando todavia que "foi ela o caso de mais profunda criação entre as mulheres que publicaram nos anos 20 portugueses".
Para outros não é um astro da grandeza de vários dos seus contemporâneos. Estará um tanto em atraso, quer quanto à forma, quer quanto às suas preocupações. Como explicar então que seja qualificada por muitos como um dos vultos do século - e o seja, pela projecção que acaba por atingir?
Hernâni Cidade referirá "a violenta contradição entre o conceito de poesia de duas épocas distantes ou próximas".
Alguns críticos entrelinham a análise do seu comportamento e da sua obra com dizeres onde se pressente um esforço para evitarem uma sentença relativamente dura.
Natália Correia, em longo prefácio a uma edição de Diário do último ano fala do "coquetismo patético" e refere a sua "poesia maquilhada com langores de estrela de cinema mudo, carregada de pó de arroz". E continua, exagerando um tanto, dizendo que a escritora "estende-se na chaise-longue dos seus quebrantos de diva de versos. Muito a preceito da corte dos literatos menores. Uma cadelinha de luxo acarinhada no chá-das-cinco das senhoras do Modas e Bordados e do Portugal Feminino para explicar que isso nasce da sua insensibilidade "a rupturas engendradas pelas crises do discurso lógico masculino".
Porquê então tal expansão?
O seu culto começa nela própria.
Leia-se o poema, cantado por conhecido grupo musical e um dos mais belos:
Ser poeta é ser mais alto, é ser maior
Do que os homens! Morder como quem beija!
É ser mendigo e dar como quem seja
Rei do Reino de Aquém e Alem Dor!
.............................
É ter cá dentro um astro que flameja,
É ter garras e asas de condor!
.............................
É ter fome, é ter sede de Infinito!
............................
É condensar o mundo num só grito!
............................
E quantas e quantas vezes Florbela nos recorda que é poeta! E com que euforia:
Sonho que sou a Poetisa eleita,
Aquela que diz tudo e tudo sabe,
Que tem a inspiração pura e perfeita,
Que reúne num verso a imensidade!
Sonho que um verso meu tem claridade
Para encher todo o mundo! E que deleita
Mesmo aqueles que morrem de saudade!
Mesmo os de alma profunda e insatisfeita!
Poucos poetas o farão tão repetidamente...
De modo algum pomos de lado a beleza do que escreve, da maneira como se exprime, e do que ocupa a sua escrita.
Sem excluir a qualidade literária, não serão porém inteiramente estranhos ao multiplicar da sua leitura, aspectos que de certo modo lhe serão alheios. Entre outros, o auto retrato da sua vida que desenha um tanto distante do ordenamento e preconceitos sociais da sua época, as variadas contradições, ou aparência de contradições (como admite José Régio) a tragédia da sua morte, o seu empenhamento na publicação, esforçado e continuado, os locais onde vive, propensos à glorificação dos naturais ou próximos, o seu proto-feminismo diferenciado do que se lhe seguirá uns anos mais tarde, mas capaz de chamar a atenção.
Um nome, Guido Batelli, italiano, professor da Universidade de Coimbra, não poderá ser esquecido. Ao traduzir para a sua língua vários dos poemas de Florbela, cria um facto que não se pode dizer muito comum .
E admirando-a sinceramente, contribuirá para a edição (póstuma) de Charneca em Flor, Reliquiae e Juvenilia. É provavelmente com a sua intervenção que se fazem as primeiras reedições do Livro de Mágoas e do Livro de Soror Saudade.
Régio, sobre o silêncio da Presença, de que diz ter vergonha, explica que só mais tarde a conhece. Chama-lhe "poesia viva" que "nasce, vive e se alimenta do seu (...) porventura demasiado real caso humano". Acompanhará sucessivas reedições de uma parte dos poemas com extenso e elucidativo prefácio, datado de 1950, onde faz análise valiosíssima, exaltando a obra e destacando alguns dos mais brilhantes momentos da poetisa...
Mas é, possivelmente, António Ferro que, em artigo do Diário de Noticias, logo em Janeiro de 1931, chama a atenção para a poesia de Florbela e provoca um acordar de críticos e leitores que até ao presente se não extingue.
POESIA. CONCEITOS E PRECONCEITOS DE AMOR
"Beija-me as mãos, Amor, devagarinho", diz Florbela. Entretanto, o que está a acontecer no resto do mundo? Consulta a Tábua Cronológica.
É a poesia que fará de Florbela o vulto que é. Quase sempre em forma de soneto.
Salvo umas tantas excepções. Algumas quadras incluídas por Rui Guedes em valiosa edição abrangendo a totalidade ou quase da poesia de Florbela .
Uma delas, com um certo sabor à chamada quadra popular:
Tenho por ti uma paixão
Tão forte tão acrisolada,
Que até adoro a saudade
Quando por ti é causada
ou esta
Que filtro embriagante
Me deste tu a beber?
Até me esqueço de mim
E não te posso esquecer...
O seu Alentejo merece-lhe palavras de exaltação. Em soneto a que chama No meu Alentejo que inclui em carta à directora de Modas e Bordados exprime-a nos tercetos finais
Tudo é tranquilo e casto e sonhador...
Olhando esta paisagem que é uma tela
De Deus, eu penso então: Onde há pintor
Onde há artista de saber profundo,
Que possa imaginar coisa mais bela,
Mais delicada e linda neste Mundo?
Escreve também poemas de sentido patriótico. Um deles, dirigido às mães, apelando que calem as suas mágoas pelos filhos que lutam e morrem na guerra em defesa da Pátria, e alguns outros de sentido semelhante.
Mas Florbela lembra claramente que o que a preocupa é o Amor, e os ingredientes que romanticamente lhe são inerentes: a solidão, a tristeza, a saudade, a sedução, a evocação da morte, entre outros... E o desejo. Mesmo quando trata outros temas, diz-me alguém que a admira. Olhemos uma das quadras do soneto que intitulou Toledo
As tuas mãos tacteiam-me a tremer...
Meu corpo de âmbar, harmonioso e moço,
É como um jasmineiro em alvoroço,
Ébrio de Sol, de aroma, de prazer!
O grande paradoxo. O amor, como muitas vezes se lhe refere, sugere um sentir onde o erotismo é componente permanente. Exaltado em vários escritos, noutros pretende ser limpo do que na época se consideram impurezas.
Após os vários casamentos, diz desejar morrer virginalmente.
Tudo produto duma moral que interditava à mulher exprimir o seu prazer sexual, segreda-me uma outra minha amiga, para quem Florbela é o grande expoente da escrita no feminino. As sugestões mais ousadas sobre sexo eram tidas como degradação ou, complacentemente, como provocação, recorda-me.
Pergunta que não terá resposta fácil é saber se Florbela escreve, aproximando-se do explícito, porque pretende romper com os comportamentos tidos como convenientes e dentro do moralmente correcto.
Olhamos o soneto Passeio ao Campo onde começa
Meu Amor! Meu Amante! Meu Amigo! Colhe a hora que passa, hora divina,
bebe-a dentro de mim, bebe-a comigo!
e depois de referir a "cinta esbelta e fina..." e outros atributos da sua própria elegância física, continua
E à volta, Amor... tornemos, nas alfombras
Dos caminhos selvagens e escuros,
Num astro só as nossas duas sombras...
Num outro
Se tu viesses ver-me hoje à tardinha,
A essa hora dos mágicos cansaços,
Quando a noite de manso se avizinha,
E me prendesses toda nos teus braços...
para concluir
E é como um cravo ao sol a minha boca...
Quando os olhos se me cerram de desejo...
E os meus braços se estendem para ti...
O erotismo não fica por aqui. Num outro poema diz:
Sonhei que era a tua amante querida
......................................................
........................................anelante
estava nos teus braços num instante,
fitando com amor os olhos teus
E ainda em sentido semelhante, estes tercetos
Beija-me as mãos, Amor, devagarinho...
Como se os dois nascêssemos irmãos,
Aves, cantando, ao sol, no mesmo ninho...
Beija-mas bem!...Que fantasia louca
Guardar assim, fechados, nestas mãos,
Os beijos que sonhei pra minha boca!...
Mau grado dizeres que, pelo sensualismo, sugerem um sentido libertário, uma interpretação do conjunto da sua obra faz pensar em posição cultural divergente.
Contraditoriamente com essa sensualidade sempre presente, afirma não poder olhar para o relacionamento sexual sem um sentimento de impureza, de brutalidade. Em alguns trechos, onde mais fortemente sugerido, as mulheres são impuras, megeras ou sujeito de outros qualificativos semelhantes.
O casamento e a posse são brutalidades, afirma e repete.
A PROSA
A prosa de Florbela exprime-se através do conto e de um diário que antecede a sua morte e em cartas várias, de natureza familiar umas, outras tratando de questões relacionadas com a sua produção literária, quer num sentido interrogativo quanto à sua qualidade, quer quanto a aspectos mais práticos, como a sua publicação. Nas diferentes manifestações epistolares sobressaem qualidades que nem sempre estão presentes na restante produção em prosa - naturalidade e simplicidade.
Nos contos, compilados em dois volumes, O Dominó Preto e As Máscaras do Destino, muitas vezes um certo sentido autobiográfico, intimista.
No já referido À margem de um soneto, como atrás dizemos, parece pretender retratar as diferentes personalidades em que se vê, contraditórias e provocantes em relação à época
Num outro conto, Amor de outrora, pressente-se um recordar de ocorrências da sua vida e dos seus enganos e desenganos de amor, desde o primeiro ao terceiro casamento. Várias cartas, para os maridos e para os apaixonados que aparentemente pretende afastar, e para o pai, em que procura justificar algumas situações, ajudam a este entendimento.
Em Crime do Pinhal, ao lado dos "lavadores de honra" pelo assassinato de um sedutor, duas mães no afecto da mesma criança. As suas "madrastas mães" cujo grande e simultâneo afecto por Florbela é retribuído?
No inicio de As Máscaras do Destino, dedicatória a Apeles, o seu Morto, para quem mais uma vez palavras de exaltação e dor, que complementa em O Aviador, visão mítica da morte do irmão amado.
Ao longo dos contos encontram-se frases de grande beleza e força. As expressões de desejo, carregadas de erotismo, atribuídas à personagem do segundo dos referidos contos – que, de algum modo, exprimem as suas contradições na transição para a libertação da mulher. Não podemos porém deixar de os considerar por vezes carecendo de uma certa densidade. Um excessivo uso de palavras e imagens, que pouco ou nada acrescentam ao que pretende sugerir, contribui para uma menos conseguida "análise profunda dos sentimentos e paixões", observa Y. Centeno. E, como nota a mesma escritora, quase permanente é a qualificação das mulheres em puras e impuras, em excelentes e megeras.
As suas cartas, sem a pretensão da criação literária, e talvez por isso, a par da informação factual, apresentam uma visão muito menos enfeitada e artificiosa da sua vivência. Permitem conhecê-la melhor e exprimem estados de alma mais próximos duma humanidade real do que a sua prosa formal e, até, alguns dos seus momentos poéticos.
Sobressaem as que envia à sua amiga Júlia Alves, com quem nunca se encontrará, com quem troca impressões sobre os mais variados assuntos e a quem expõe a sua alma à medida que o relacionamento vai progredindo. Numa delas dirá: "preciso tanto de ser embalada devagarinho... suavemente... como uma criança pequenina, sonhando de olhos fechados, num regaço carinhoso e quente!..." O que talvez ajude a compreender a sua vida e a sua morte.
Numa outra, já após o primeiro casamento, afirma - e isto é por ela redito e contradito: "uma das coisas melhores da nossa vida... é o amor, o grande e discutido amor... " acrescentando umas linhas a seguir que "no entanto, o casamento é brutal, como a posse é sempre brutal..."
Escreve à sua amiga com frequência que não deixa de surpreender. Em dias seguidos. Num mesmo dia três missivas distintas. Na que se presume ser a última, um pouco menos de um ano depois da primeira, e já sem o calor que se pressente nas anteriores, agradece dizendo que não esquece o ter-se sentido compreendida e estimada
Em correspondência dirigida a outras personalidades mostra-se triste pois não vê facilitado o caminho para a publicação dos seus livros.
A Raul Proença deixa claro o seu desânimo com o que este pensa dos seus versos, juntando outros sonetos perguntando se desses gosta. O escritor virá a proporcionar-lhe a publicação (Livro de Mágoas).
Traduzirá dois livros (e possivelmente outros), um de Pierre Benoit, Mademoiselle de la Ferté, que constitui leitura obrigatória dos adolescentes da década seguinte à sua morte, e Dois Noivados de Clambol, editados pela Liv. Civilização, do Porto. Assina as traduções como Florbela Espanca Lage. Antes, em várias circunstâncias, usara Florbela Moutinho, apelido do primeiro marido.
O FIM
No último ano de vida elabora um Diário, onde deixará anotações até escassos dias antes do trágico fim. Prefácio a esse fim.
Logo no início explica não ter qualquer objectivo ao escrevê-lo.
Pouco depois do começo espera que "quando morrer é possível que alguém" ao lê-lo "se debruce com um pouco de piedade, um pouco de compreensão," sobre o que foi ou julgou ser. "E realize o que eu não pude: conhecer-me".
Define-se "honesta sem preconceitos, amorosa sem luxúria, casta sem formalidades, recta sem princípios, e sempre viva", o que encaminha para algumas das questões que se põem..
Depois de recordar os nomes de companheiros e mostrar uma vez mais o amor pelo irmão, Apeles, aviador, cujo desaparecimento em desastre do seu avião a faz sentir mais só. Diz não compreender o medo que a morte causa à jovem autora de um Diário de que reproduz algumas frases.
Examina-se diante do espelho e dizendo-se "grosseira e feia, grotesca e miserável" põe em dúvida se saberia fazer versos. Colocando-nos uma vez mais em face das contradições que a atormentam permanentemente e que exprime numa outra frase: "Viver é não saber que se vive".
À medida que caminha para o final as anotações são cada vez mais raras e curtas.
Afirma que as cartas de amor que escreveu resultavam apenas da sua necessidade de fazer frases. E em oposição frontal com o dito páginas atrás escreve "se os outros não me conhecem, eu conheço-me".
Poucos dias antes de morrer interroga-se "que importa o que está para além?" Responde, repetindo o que diz no soneto A um moribundo: seja o que for será melhor que o mundo e que a vida.
A morte anunciada ao longo da sua escrita ocorrerá pouco depois. Põe fim à vida em 8 de Dezembro de 1930, dia em que faz trinta e seis anos, em Matosinhos, onde vive. Aí é enterrada sendo mais tarde trasladada para a sua terra natal.
Com Florbela morre, não talvez a maior poetisa do seu tempo, mas uma das que mais agudamente e sem temor exprimiu as grandes contradições da sensibilidade feminina nas suas paixões. Ao mesmo tempo, com uma certa ingenuidade, impregnada das verdades simples ou complexas do que é a mulher, na convergência da cultura e do ser.
Que conduz Florbela para a morte?
Fernanda de Castro, em escrito citado por Carlos Sombrio, sintetiza a resposta: "Porque nunca soube pôr de acordo o seu corpo, o seu espírito e a sua alma".
Do acontecimento os jornais quase não dão notícia. Fá-lo-ão a partir daí.
Postumamente são publicadas, por iniciativa do professor Guido Batelli, como atrás se diz, os dois livros de poemas Charneca em Flor e Reliquiae, duas colectâneas de contos, Dominó Negro e Máscara do Destino e uma outra de poesia, Juvenilia.
Começo de uma sucessão de reedições que no caso da poesia alcança já, em alguns casos, a ordem das três dezenas, ou mais, se recordarmos a dispersão editorial.
E alem das de Guido Batelli, algumas traduções, não apenas para italiano.
quinta-feira, maio 06, 2004
Jantar...
Olá colegas, como têm passado?
Eu não vou poder ir ao jantar, mas espero-vos no dia 15, no "almoço-lanche" das fitas.
Beijinhos,
CarlaNabais
Eu não vou poder ir ao jantar, mas espero-vos no dia 15, no "almoço-lanche" das fitas.
Beijinhos,
CarlaNabais
domingo, maio 02, 2004
Jantar = Almoço ??
Boas,
Não poderá ser antes um almoço?? No dia oito, por exemplo??
Na sexta (sete Maio) não vai dar para mim...
..::carlos galveias::..
Não poderá ser antes um almoço?? No dia oito, por exemplo??
Na sexta (sete Maio) não vai dar para mim...
..::carlos galveias::..
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